sexta-feira, 11 de abril de 2014

/pes ar

Ele sugeria que puséssemos as coisas no chão. Todas as coisas. Eu sorria por dentro. Vi o primeiro grande sonho da minha vida realizado: tinha pouco ou quase nada excedente ao corpo.
Na intenção de negar esses, ainda que poucos, excessos a serem depositados no chão, amarrei os sapatos na cabeça e pendurei a chave no suvaco. Deu! Nada a declarar...
Tirem as roupas e circulem.
Sai shortinho, sai meia calça. Tinha o top amarrado com os sapatos na cabeça. Sai camiseta e peitolas ao vento? Descarga de endorfina. Não sei bem porque, mas ainda não. Sigo de camiseta, calcinha, sapatos na cabeça e chave no suvaco.
Inventar demais as vezes complica o rolê, mas sempre vale a pena... Desamarrei a porra do sapato da cabeça (na real, meu sonho tava longe de ser realizado porque percebi que mesmo no dia em que tinha quase nada de peso, meti esse quase nada na cabeça e senti algum peso. O dia da levezalivrefluir chegará?)

Visita ao zoológico dos apegos
Trajes escuros compunham um bolor em meio a paisagem. Cuecas, meias, muitas. Dinheiro, dinheiro. Meti as notas na calcinha e pra fingir que não tinha intimidade com elas, pendurei uma pinça ao lado. Tratei de compor o bolor como se fosse um inseto. Segmentado. Amarrei todo mundo de si em si e o último si em mim. Acoplei a estrutura à minha cauda não desenvolvida de humaninha delirante e saí pro jardim. Nos arrastamos.

Num mundo feito simétrico, os dois últimos ímpares se olham
Despojar-se
Ele começa
Ensaio pressa
Ele enumera
Eu interpelo
Sinto o vento
Olho no olho
Olho no peito
Rastejamos para que dure
Acaba
Reciclagem

A sensação de caminhar na rua pela manhã depois de uma noite de amor...

Começa
Cruzo agora com um outro, tanto faz. Dessa vez meto o dinheiro na cabeça.
Olho no olho
saio
Ar no olho

Outra de jaquetinha como eu pela rua. Cumplices.

Abdicar do outro
Deixar tudo o que era dele em mim e seguir

Sinto

Ali, acoplado ao lóbulo esquerdo da cabeça tem um macinho de notas preso com um grampo no meu ensaio de franjinha.
Percebo e processo essa informação como se digerisse carne depois de anos de vegetarianismo.
O dinheiro ali, grampeado na cabeça, ativava circuitos neuronais que zigzaguiavam hologramas de estima a vida cigana e nublavam anseios de desprendimento e leveza.

Tenho o corpo pesado de atos falhos flagrados e overdose de razão. Tava tudo tão prazeroso até agora... Como eu fui tropeçar no pé do juiz? Acabei caindo. Escutei o corpo, rendido ao chão, gemer:
- O que pesa é a culpa, e não a matéria que carrego para falar sobre ela.

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